23/10/2012 | ECONOMIA
ARTIGO: Lei de responsabilidade fiscal seria saída para crise
O Brasil é o exemplo do que a Europa tem que
fazer, segundo Antonio Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda. “Demos nosso grande
passo com a lei de responsabilidade fiscal”, afirmou.
“Vem o governo, organiza as dívidas, não perdoa ninguém e emite papei da
União pagando a Selic, ou seja, tornando possível a organização dos estados, é
isso que tem que ser feito e o Draghi (presidente do BCE
) está tentando
fazer e os alemães tem dúvida”, disse Delfim Netto durante o Seminário
“Perspectivas das Relações Econômicas entre o Brasil e os Países Árabes”.
“Não há economia de mercado sem um estado forte capaz de regular a atividade
econômica, principalmente a financeira. A experiência que vivemos hoje confirma
esse fato, que sabíamos há muito anos”, disse. Para Delfim, as causas da crise de
2007/2008 são as mesmas da crise de 1929 mas, na década de 30, a reação do
Estado foi mais eficaz. “Lá a reação do Estado foi mais eficaz, fez uma lei de
controle, regulação do sistema financeiro que permitiu a ausência de crises por
30 anos”, disse. Delfim afirmou que desde então os economistas começaram a
inventar fórmulas para precificar o risco corretamente, permitindo assim que
corressem mais riscos e se alavancassem – aumentando a probabilidade de risco.
“Em algum momento o risco acontece e o sistema todo desaba”, disse.
União (política) Europeia
A construção europeia é sobretudo política, nasce no pós-guerra para tentar
solucionar anos de conflito, segundo o economista Luiz Gonzaga Belluzzo. E foi
bem sucedida nisso, segundo Delfim Netto, basta observar a sequência de guerras
na história do continente e a inexistência de conflitos armados entre países
europeus na história recente. “A eurolândia é a coisa mais importante do século
XIX”, disse Delfim.
“Na construção do Euro houve um desequilíbrio na construção do espaço
monetário e a inexistência do espaço fiscal”, disse Belluzzo. Em outras
palavras, o euro tem uma perna a menos, o que dá fragilidade a esse sistema
monetário, segundo o economista.
Belluzzo compara a relação dos países da zona do euro com a Alemanha com a
relação entre EUA e China, em que alguém consome o que o outro produz. “Teria
que ocorrer com a Alemanha o mesmo que tem que ocorrer com a China em relação
aos EUA para reestabelecer o equilíbrio. A Alemanha precisa abandonar a ideia de
que os outros tem que consumir por ela. A Alemanha precisa incitar o consumo
interno para ajudar na recuperação dos demais”, disse. Antes, é preciso
reestruturar as dívidas, e isso cabe ao Banco Central Europeu, segundo Belluzzo.
“É a lei de responsabilidade brasileira”, afirmou.
Para Luiz Carlos Mendonça de Barros, diretor estrategista da Quest
Investimentos, estamos na fase de cura, de solução dos desequilíbrios que
geraram a crise. “Dessa vez o desequilíbrio foi muito maior que o de 1930. A
cura está muito mais difícil e muito mais demorada”, disse. Já se foram cerca de
cinco anos de crise nos EUA e Mendonça de Barros projeta mais dois anos para
chegar ao fim da situação atual. “A economia dos EUA está em processo de cura e
agora há um processo de ajuste fiscal que tem que ser feito”, afirmou.
Mendonça de Barros acredita que a China vai recuperar seu crescimento no
próximo ano. “A China é um caso da mesma natureza da Europa, há um arranjo
política de outra natureza, estabelecido há muito tempo. A dinâmica política da
China é diferente. Lá, se der errado, vai todo mundo pro paredão. E é por isso
que não dá errado”, disse.
Na Europa, o processo de cura é diferente, segundo Mendonça de Barros. O
economista concorda que o Brasil poderia levar para a Europa o que foi feito
aqui com as dívidas dos estados. “Em uma organização política complexa como a
Europa a cura vai levar muito tempo. A Europa deve levar mais um ou dois anos
para entender o que está acontecendo”, disse. Para o economista, o colapso do
euro poderia atrapalhar o Brasil, mas isso não deve acontecer, por causa do
arranjo político. “Uma boa notícia é que o mundo não vai acabar”, brincou Delfim
Netto “nem o capitalismo vai acabar”, disse
(Delfim Netto, Luiz Carlos Mendonça de Barros e Luiz Gonzaga Belluzzo participaram do Seminário “Perspectivas das Relações Econômicas entre o Brasil e os Países Árabes”, realizado pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira e pelo jornal Valor Econômico)