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 16/01/2012 | OUTROS

Em capacitação na Bahia, técnicos rurais aprendem características diferenciadas dos quilombolas

Pela primeira vez, famílias de comunidades remanescentes de quilombos receberão a visita de profissionais especializados em assistência técnica e extensão rural (Ater). A partir de fevereiro, 65 técnicos percorrerão 39 comunidades em quatro estados brasileiros - Bahia, Minas Gerais, Pernambuco e Maranhão. A missão: traçar um diagnóstico da situação de 4.480 famílias que residem nessas comunidades, montar projetos de estruturação produtiva e ser o elo para o atendimento a suas demandas individuais e coletivas. Nesta segunda-feira (16), esses profissionais começaram a ser treinados para a experiência. Até sábado (21), eles participam de uma capacitação na sede da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), em Salvador.

Acostumados a levar orientações sobre agricultura familiar para moradores de zonas rurais de todo o país, os técnicos selecionados aprenderão, ao longo da semana, a trabalhar de forma diferente com as famílias quilombolas, que guardam características peculiares. O isolamento geográfico, as disputas fundiárias, a falta de infraestrutura, tradições, costumes, cultura, o preconceito que ainda afeta os quilombolas são aspectos que exigem abordagem cuidadosa dos técnicos. Daí a necessidade de entender detalhadamente aspectos históricos, políticos e antropológicos que terão de ser levados em consideração, além da orientação para a produção agrícola familiar.

"Todos sabemos que é complexo dialogar com as famílias de áreas rurais brasileiras. Essa complexidade aumenta quando falamos de povos tradicionais e quilombolas", diz o diretor do Departamento de Promoção da Alimentação Adequada do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Marcos Dal Fabbro.

Além de identificar as famílias mais pobres e incluí-las no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, Dal Fabbro acredita que as equipes terão outro papel fundamental para o desenvolvimento sustentável das comunidades. "A assistência as ajudará a dar o primeiro passo para que, futuramente, possam se inserir no Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais", aposta. O programa, que faz parte do Brasil Sem Miséria, oferece recurso de R$ 2,4 mil, em três parcelas, para ajudar famílias a estruturar sua produção.

Além de apresentar o Plano Brasil Sem Miséria, com seus objetivos, eixos de atuação e estratégias, o primeiro dia da capacitação também levou aos técnicos os números, histórico de ações e metas do Programa Brasil Quilombola,coordenado pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir). A partir dessa capacitação, os técnicos irão até as comunidades. Primeiro, se reunirão com as lideranças para explicar o trabalho. Depois, visitarão as famílias. "A intenção é traçar um diagnóstico não só da situação de cada uma, mas das demandas coletivas de cada comunidade", diz o assessor especial de políticas para Povos e Comunidades Tradicionais do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Edmilton Cerqueira.

Estruturação - O próximo passo será elaborar projetos de estruturação produtiva individuais e coletivos em todas as comunidades, o que inclui desde a distribuição de sementes de feijão, milho e hortaliças até o encaminhamento das famílias para o programa de fomento ou para obtenção de créditos especiais. "Não será algo imposto de cima para baixo pelos técnicos, mas algo construído com as famílias, com as comunidades", destaca Edmilton Cerqueira. Segundo ele, outras chamadas públicas para atendimento a comunidades quilombolas serão feitas até 2015, dentro do Brasil Sem Miséria.

Das 39 comunidades quilombolas atendidas na primeira chamada pública de Ater, 26 ficam na Bahia. Elas se concentram no município de Campo Formoso, região de Semiárido. "É um público diferenciado. Nem todo técnico, agrônomo, veterinário, zootecnista, profissional da área social ou de saúde tem conhecimento a priori de como trabalhar com comunidades quilombolas, com sua relação e forma cultural de ser diferenciada", explica o presidente da EBDA, Elionaldo Teles. A EBDA será a responsável pelo trabalho com essas comunidades no estado.

Para Elionaldo, a chamada pública traz a oportunidade de experimentar a expressão e a situação da assistência técnica com foco em comunidades tradicionais, que historicamente nunca tiveram assistência articulada. Ele ressalta a importância de garantir a essas famílias uma assistência integral: "O curso terá que focar, entre os técnicos, essa ideia, essa visão de que não se trata apenas de produção e produtividade. Quando a gente só produzia no Brasil, a gente teve grandes momentos em que se queimava cebola, em que se jogava fora leite, em que se queimava frango", lembra. "Agora, a gente consegue, por meio do próprio MDS, fazer a revolução, que é viabilizar a produção da agricultura familiar e, consequentemente, ter a destinação direta a quem mais necessita."

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